Manter amigos, no Rio de Janeiro…

Pouco tempo atrás escrevi um post sobre fazer amigos aqui em Lisboa. E essa semana eu me deparei com uma situação extremamente decepcionante e desagradável, e me fez pensar nos amigos que deixei no Rio, cidade onde nasci e fui criada toda a minha vida.
Lembrei de situações em que a dedicação que tive como amiga foi totalmente descartada de uma hora pra outra, e a sensação de ter sido usada é péssima.

Uma amizade de mais 12 anos foi descartada por imaturidade. Eu até achei que a amizade ia se restabelecer, mas… enganei-me.
Uma amizade de 4 anos, foi esquecida porque eu não era mais necessária.
Uma amizade que durou pouco, apenas dois anos, foi dispensada por covardia (e isso me incomoda até hoje, apesar de já terem se passado 6 anos).

E depois de vir pra cá, de ficar um ano reclusa em casa, descobri a insignificância da minha existência para uns, e talvez até com algum sintoma de depressão, eu rebaixei algumas pessoas da hierarquia de “minhas amigas” para “pessoas legais que fizeram parte da minha vida”. Talvez assim eu sofra menos por eles não fazerem esforços pra manter contacto comigo, ou por não prestarem atenção nas respostas que dou às perguntas que me fazem por email (e aí? como está? já conseguiu um apartamento? tá trabalhando? quando volta?) – porque sempre perguntam as mesmas coisas como se fosse a primeira vez – ou porque esqueceram a razão da minha vinda pra Portugal e acharem que estou aqui pra esfregar na cara de alguém que estou na Europa, ou porque acham que quero enriquecer e voltar montada na grana e esfregar na cara das pessoas, ou por acharem que eu me sinto superior por não estar mais no Brasil… e por isso eu criei esse escudo de protecção. E funciona!!

Antes de continuar a falar sobre o que está me abalando emocionalmente há 5 dias, quero apenas deixar claro as razões que me fizeram sair do Brasil:
em primeiro lugar: a violência. Quem me conhece sabe dos dois assaltos traumáticos que eu passei, muito próximos um do outro, e no segundo eu consegui escapar de um sequestro relâmpago mas dois amigos muito importantes nas nossas vidas não. Eles foram levados pelos assaltantes, na nossa frente, na porta da minha casa e ficaram duas horas sob a mira de uma arma escutando a discussão dos bandidos sobre matá-los ou não. Eles hoje estão bem fisicamente, mas esse acontecimento deixou sequelas.
–  o custo de vida no Rio de Janeiro para um jovem casal e que pretende ter filhos. Escola, plano de saúde, seguro de carro, IPVA, IPTU, IRPF, condomínio, alimentação, luz, água, gás, tv e telefone. Precisávamos de uma renda mínima de R$5.000,00/mês (aproximadamente 2.100,00€) para conseguir pagar as contas do mês.
– oportunidade de emprego. Não acabei a faculdade e nem o meu marido. Ele tinha saído de uma sociedade numa empresa familiar, e não tinha perspectiva profissional no Rio. Investiu numa certificação da SAP e tentou o mercado de trabalho no Rio e São Paulo. Por ser muito restrito, pesquisamos sobre o mercado de trabalho em Portugal e vimos as portas abertas.

Não somos fúteis de largar toda a nossa família, emprego, amigos, estabilidade emocional, a troco de um status de “morar na europa”, ou de fazer isso para os outros.
Eu não tô preocupada em PARECER. Não quero aparências. Não vivo de aparências e nunca vivi.  Vou fazer de conta que não viajei esse ano pra Londres (destino que estou louca pra conhecer e fiz muita força pra ir lá este ano) pq preferi passar as férias em casa?  O dinheiro não deu e ponto final. E se alguém me perguntar, qual a razão de mentir? Não rolou, a grana tá curta.
E sobre ir ao Brasil de férias… o custo de UMA passagem aérea é o valor de DUAS + hospedagem, pra um destino europeu.

Tendo isso esclarecido, volto à razão deste turbilhão de pensamentos.

Uma amizade de mais de 10 anos está sendo abalada por razões que desconheço.
Uma pessoa que eu considero amiga, que sabe como eu sou e como eu penso, me atacou pessoalmente durante uma discussão política, como se eu fosse uma desconhecida que saiu do Brasil por razões frívolas.
Por que pensar assim??? O que a levou agir desse jeito? O que eu fiz? Não votei na Dilma, desgosto da hipocrisia do PT hoje e por isso sou egoísta??

Sim, meus valores são diferentes. Meus princípios são diferentes dos seus, cara amiga. E você sabe que eu penso diferente, que não concordo com tudo o que você fez até hoje, mas sempre te apoiei e te respeitei, e sempre dei apoio a quem mais te ama, pra ultrapassar cada momento difícil desde que suas vidas se uniram.

Se isso não é amizade, eu não sei se são os meus valores que estão errados.

Sim, eu amo meus amigos e digo isso com todas as letras. AMO!!!!
Amo como irmãos, como parte da minha alma. E sempre vou dizer que os amo, mesmo que eles não repitam de volta em voz alta esse verbo lindo, mas eu sei que vão refletir esse verbo em ações. Amar um amigo, mesmo do sexo oposto, e esse amor limitar-se ao sentimento fraterno, lindo e puro que é a amizade, é possível sim.

Acho que é por isso que dói tanto quando um amigo magoa.
Já tive desilusões amorosas, mas essas não doeram tanto como as desilusões fraternas.

E essa particularmente doeu mais que as outras que citei no começo do post, porque essa… afeta indiretamente uma pessoa muito importante na minha vida. Eu deveria ser direta, mas… fazer uma pessoa que eu amo sofrer, é muito pior do que apenas o meu sofrimento.
Eu poderia ser egoísta, cara amiga, e esquecer uma história de anos de cumplicidade e apoio para te dizer diretamente tudo o que está doendo, mas não. Não jogo fora pela sanita 10 anos de muita amizade.

Decidi escrever no meu blog sobre isso por duas razões: fiquei quase uma semana com os pensamentos bloqueados, meu facebook (que eu uso pra expressar tudo e mais um pouco) ficou parado, não consegui continuar a leitura do meu livrinho, não consegui esquecer o assunto.

E a outra razão é para alertar às pessoas que saem do meio onde cresceram e mudam de cidade ou país, que é difícil entender a cabeça dos que ficam. Mesmo sem fazer absolutamente nada, nós criamos desafetos apenas por não estarmos mais por perto.

4 opiniões sobre “Manter amigos, no Rio de Janeiro…”

  1. Olá Carol, li algumas coisas no seu blog, enviei um e-mail pra vc e estou aguardando ansiosamente sua resposta.
    Abraço

  2. Olha, não se sinta assim. Ou melhor, no começo, você vai se sentir assim, mesmo, não tem jeito. Parece que a gente morreu. É difícil saber que as pessoas sobrevivem e vivem normalmente sem a nossa existência. Parece que nossos espíritos vagam por cima de suas cabeças, verificando tudo, mas não pode tocar em nada. Sim, passamos a ser seres estranhos e distantes, o que de facto é. Senti a mesma coisa que você, quando escrevia e não obtinha resposta, mandava cartas e ninguém dizia nada, contava novidade e… então? Nada. Só depois de muitos dias é que uma alma me dizia qualquer coisa. Com o tempo, você vai aceitando também a distância das pessoas. Tenho amigos insubstituíveis no Brasil, mas eles apenas estão lá. Quando quero qualquer coisa, sei que posso contar com a ajuda deles, mas… devo ter a paciência de esperar pelo tempo que eles têm para me dar. Outra coisa, não leve em conta essa onda das eleições. Isso mexe muito com os nossos nervos. Quase perco alguns amigos também batendo-boca sobre política. Não vale a pena. Nossa linha de união é muito frágil e não vale a pena arriscá-la por motivos tão banais.
    Bjs.

  3. Carol, mais uma vez estou aqui. É raro quando posto comentários, deve ter não mais que uns 3 meus no seu blog, tantos quanto os posts que deixo no seu Facebook.

    Quando faço isso é porque me identifico até a raiz dos cabelos com tuas histórias.

    Já leu o livro (ou viu o filme) Fernão Capelo Gaivota (Jonathan Livingstone Seagull, no original)? É um livro/filme bem velho, lento, sem ação, romance ou comédia. Mas conta EXATAMENTE essa história, de todos nós, que decidimos que não vamos ser apenas “mais um no bando”.

    Se não leu ou viu o filme… vale a pena. Acredito que não vais mais sentir-se tão mal depois dele.

    http://en.wikipedia.org/wiki/Jonathan_Livingston_Seagull

    Beijos

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