Vida de imigrante é assim: você decide mudar de país e as pessoas fazem um drama, dizem que você é maluco, que não vai aguentar, mas que deseja sorte.
Reaparecem pessoas na sua vida que antes não te procuravam porque você morava no subúrbio (sim, porque você é você, mas o seu bairo… poxa vida…), e querem ficar suas amigas porque agora você vai pra fora do país (o famoso “tá fazendo isso porque enricou”).
Aí você chega na sua nova terrinha, tá se ambientando, enfrentando toda a dificuldade e pontos de interrogação que surgem na sua frente e quando se comunica com quem ficou lá na cidade de origem só ouve “e aí? volta quando?”. Então você, depois de explicar umas 60 vezes para as pessoas que você não tenciona voltar e pretende ficar por ali se der certo, as pessoas somem. E não ligam no seu aniversário. Nem no Natal. Esquecem de você.
E depois de um ano lembram que você existe e perguntam se vc está gostando, se está viajando muito e quando volta (como se uma pessoa que mudou de cidade/país em busca de uma vida melhor estivesse em condições de fazer tour a passeio). E de repente as pessoas somem novamente. Não todas. Algumas ficam e te acompanham. Algumas amizades que você julgava serem coleguismo se revelam verdadeiras e profundas. Algumas que você julgava serem verdadeiras e profundas se revelam verdadeiros coleguismos. E de repente, seres humanos que não falavam com você minimamente, ou que eram falsos como tudo, começam a te adicionar em redes sociais. Pra que? Não sei (não cliquei no “confirmar amizade” pra descobrir).
E estando de longe você conseguiu separar o joio do trigo, as pessoas que são mesmo suas amigas e as que só querem fofocar sobre a sua vida, ou as pessoas que não precisam ser tão amigas assim pra te desejar o bem.
Finalmente, pensamos nos laços que temos com as pessoas. O que nos faz amigos? O que me torna amigo de uma pessoa e não de outra? Afinidade? Laços familiares?
Eu sei que sou uma pessoa difícil de agradar, mas me dou bem com muita gente. E algumas pessoas que dividem DNA comigo não dividem a mesma afinidade, os mesmos interesses. Será que é suficiente pra alguém ter apenas grau de parentesco para fazer parte da minha vida? Já indaguei isso em algum post no passado e volto a indagar.
Outro dia eu estava falando com o meu irmão sobre uma discussão que aconteceu após uma festinha familiar. Pessoas da minha idade, a maioria criada comigo, meus primos-irmãos (filhos dos meus tios – e são muitos) tendo que gerir um certo barraco que foi criado por palhaçada, coisa pequena.
E depois de ouvir toda a história, saber o que se passou, ouvir pontos de vistas, cheguei a conclusão que… eu não pertenço àquele mundo. Acho que nunca pertenci. Não me identifico com aquelas pessoas ou atitudes. Será que foi porque eu me afastei e perdi contato? Ou será que só existia contato porque eu estava próximo? Intrigas, fofocas, querer saber da vida do outro, competição, disse-me-disse, indiretas… detesto isso. Sou muito frontal pra aguentar sobreviver nesse mundinho Manuel Carlos.
Será que fiquei besta? Será que foi o fato de morar na Europa que me faz superior (como dizem que eu sou lá no mundinho Manuel Carlos)? Ou será que eu na verdade não me encaixo?
E ontem eu tive a resposta. Deixe-me explicar:
Tive uma infância muito divertida. Minha mãe trabalhava na IBM desde que eu não existia nem em projeto, e tinha alguns amigos, e convivia com as pessoas. E quando eu era criança (e desde que eu me conheço por gente) esses amigos (que não eram poucos, seriam precisas umas 4 mãos para enumerar essa gente toda) se reuniam nos fins de semana, em happy hours, em viagens da empresa. E eu tive a oportunidade de estar lá no meio daquele povo todo. E os filhos de alguns amigos também. E era fantástico! Eu adorava os encontros do pessoal da IBM. Lembro das pessoas rindo, dançando, comendo, meu pai preparando seus quitutes, eu cumprimentando os mais velhos, que sempre eram fantásticos comigo. Eis que quando eu tinha 11 anos as pessoas foram mudando de departamento, saindo da empresa, minha mãe também deve ter mudado de área (lembro que ela saiu do prédio da Presidente Vargas pra trabalhar na Dutra), e as festas foram ficando escassas… até que acabaram.
Além desses momentos legais eu também tive outros momentos legais, com meus primos, na casa da minha avó, tios, em festas de família. Era muito legal. Depois crescemos, adolescemos, e… real life. Os caracteres se formando, as índoles. Crises familiares. E tive uma sensação de decepção grande por pessoas que eu antes admirava. E de repente virou um sentimento de não-pertença.
Meu meio social resumiu-se aos bons amigos que eu fiz na escola, alguns familiares e aos excelente amigos que diz depois, no trabalho. Pessoas essas que eu amo muito e os tenho no meu coração, e que nunca me abandonaram, nem mesmo quando todas as outras pessoas esqueceram de mim. Ok, alguns disseram que não me ligaram no meu niver porque a ligação era muito cara (R$1,40/min na época, e eu fiquei fula pq não valia nem isso), mas isso passou e já está tudo esclarecido rs
Ontem eu reencontrei uma das pessoas que brincava comigo nas reuniões da galera da IBM quando eu tinha uns 8 anos de idade. E olha… foi o máximo! Nossas mães devem ter ficado super orgulhosas vendo as fotos que tiramos depois de uns 20 anos sem nos ver ou falar. Éramos crianças, nossos pais perderam contato, portanto, nós também.
Na verdade eu tenho contato até hoje com algumas amigas da minha mãe daquela época e por isso esse reencontro foi possível.
Naquele noite, voltando pra casa, depois de momentos super agradáveis de papo e lembranças, cheguei a conclusão de que esse é o meu mundo. Esses são os meus laços.
Meus laços são com pessoas que agregam, que são autênticas, que não querem agradar ninguém, que não diminuem, que dão risadas largas e sonoras, que apreciam as pequenas coisas, como dividir experiências, um bichinho de pelúcia velhinho, uma música que sempre nos faz rir, uma lembrança carinhosa.
Meus laços não existem por questões sanguíneas, ou seja, ser parente de sangue não significa uma obrigação para existir um relacionamento. Lógico que eu tenho parentes que eu amo! E amo muito e tenho muita saudade, mesmo não tendo contato constante. Mas amo pelo que são pra mim desde sempre, não pelo que diz o mapa da árvore genealógica. Minha família é gigante (de ambos lados, meu pai tinha 9 irmãos, minha mãe tinha 8) então certamente nos identificamos mais com alguns e com outros menos (e com alguns não me identifico nada). Mas fato é: à minha volta eu quero laços. Não preciso de nenhum outro ornamento que não sejam laços.
E o nó?
Bem, o nó eu já dei com o meu marido e esse não se desfaz por nada nesse mundo 🙂