Em 2008, chegamos a Lisboa apenas nós dois. Ninguém a nossa espera, ninguém a quem procurar.
Em 2009 passamos a ser três, em 2012 passamos a ser quatro, em 2014 éramos 5, em 2015 passamos a ser 4 novamente, depois 5 e por não ter tido opção, somos só nós 4 mais uma vez.
Hoje conto 15 dias na terra da rainha, poucas horas de sono, muitas libras gastas no Ikea, Argos e Amazon, tenho minha casa 60% do jeito que eu quero, e já posso sentar à bancada da minha cozinha, tomar uma cerveja, ouvir uma música (enquanto o marido está vendo TV com os ouvidos atentos às crianças que já dormem, caso preciso) e escrever.
Moro num bairro maioritariamente de judeus, ortodoxos e também liberais. Também vi muçulmanos e pessoas cujos trajes não faço ideia de qual religião pertencem. E vi pessoas com cabelo pintados por crianças de jardim de infância (de tantas cores desconexas), piercings, chavs, góticos… E o mais legal disso tudo é que todos convivem e se respeitam. Cada um com sua crença, suas vestimentas, seus costumes, suas limitações e expansões, mas todos no mesmo lugar.
Aqui assim que chegamos e os nossos vizinhos do primeiro andar passaram pelo meu marido no corredor, fizeram questão de o cumprimentar, de se apresentar e de dar as boas vindas. Eu estava aqui em cima com as crianças, então não os conheci… naquele dia. Porque assim que eu passei pela portaria ao mesmo tempo que eles, tive a mesma recepção. Perguntaram se eu era a nova vizinha, perguntaram o meu nome, se eu estava gostando do lugar, e se colocaram à disposição para o que fosse preciso.
Isso se chama britishness. Não interessa se somos judeus, somos pessoas, somos os novos vizinhos.
Não me interpretem mal, eu adoro Lisboa e sempre estará no meu coração. Mas de certa forma eu estou aliviada de não ser mais rotulada como “a brasileira” e meus filhos também não terão esse rótulo. Não que eles não sejam brasileiros, meu marido fez questão de os registrar no Consulado Brasileiro assim que eles nasceram, mas eles são portugueses, nascidos e criados dentro da cultura portuguesa. O Tuco fala com sotaque de português, usa as palavras, as gírias, os verbos etc. E sempre foi tratado como “o brasileiro”.
Na primeira creche dele por exemplo, durante a copa do mundo, vestimos ele com o uniforme de Portugal e lá ele foi pra creche no dia de jogo. Chegando lá todas as pessoas (que eu sinceramente adoro e as tenho com muito carinho) ficaram surpresas e disseram: mas ele não vem de Brasil?
A nossa resposta foi: não, ele é português…
Esse tipo de situação é muito chata e aconteceu diversas vezes em outros lugares. Imaginem a quantidade de coisas que a Liv poderia ouvir no futuro, por ser filha de brasileiros!
Uma das principais diferenças daqui para Lisboa, por exemplo, é que hoje eu sei o nome dos meus vizinhos e eles sabem o meu. Morei 5 anos e meio no mesmo edifício, era a moradora mais antiga e conhecia todos de dizer bom dia/tarde/noite no elevador ou na garagem. Mas não fazia ideia do nome das pessoas.
Todos lá conheciam a Luka e conheceram também o Marvin, mas ninguém perguntava o nosso nome. Éramos apenas “os brasileiros”.
Por isso confesso que em 15 dias de Manchester sinto-me mais feliz do que quando estava com 15 dias de Lisboa. Se continuar neste crescente, vou me apaixonar perdidamente pela cidade e defendê-la com unhas e dentes em meses, que foi o que aconteceu com Lisboa 🙂
Vivi momentos fantásticos em Lisboa, conheci pessoas maravilhosas e fiz amigos que são como irmãos para mim, reforcei laços com pessoas que fizeram parte da minha infância, e foi muito duro dizer a eles que íamos embora. E foi muito triste a despedida. Mas faz parte. O que vivemos e guardamos nos nossos corações é o que vale e essa é a nossa fortuna. Não há bem material que valha mais que uma amizade sincera.
Agora estou a espera da vida começar a acontecer, as rotinas começarem a se estabelecer, as horas de sono aumentar.
Começar de novo, do zero. Conhecer a cidade, as rotinas, os hábitos, os bairros, as pessoas. A comida!!!! 🙂
Não há mar ou montanha que seja mais atrativo que isso. A simpatia e a cordialidade dos cidadãos locais, o tempo todo, é o melhor cartão postal de uma cidade.
Tenho seguido seu blog Carol, e me identifico quase sempre com seus relatos e desabafos. Tb sou carioca, moro em Lisboa há 3 anos e meu marido e eu já estamos com “um pé e meio” em Cardiff, País de Gales. Um casal de amigos já estão lá e falaram a mesma coisa sobre a hospitalidade do povo Galês! Como vc, amo Lisboa e defendo o que posso, mas já cansei de ser tratada pela “a brasileira”. Espero então que essa minha nova aventura seja proveitosa nas terras da Rainha!!!! Good Luck (for us)!!!